Até 1914, a guerra era quase um acto de cavalheiros. Havia conflitos, morriam soldados, eram conquistados territórios mas tudo seguia um código específico. Por exemplo, quando Napoleão invadiu a Prússia (que na altura era conhecida com um exército que por acaso era dono de um país) a Prússia viu-se num dilema: armava as populações e ganhava o conflito, ou continuava com um exército estritamente profissional e perdia. O código de honra foi mais forte, a Prússia capitulou mas manteve a cabeça erguida - não armou a "plebe" como Napoleão fez.
1914-1918 foi diferente. A primeira guerra mundial (tecnicamente a segunda, pois a guerra dos 7 anos foi mundial, mas isso é outra história) mudou tudo. Não só na forma de fazer guerra, mas nos ódios gerados pela mortandade do conflito e nos acordos de "paz". Como sabem, o bloco alemão rendeu-se em 1918 e daí seguiu um tratado de Versalhes que exigia o pagamento de 269 mil milhões de marcos à Alemanha.
269 mil milhões de marcos era, na altura, o equivalente a 100.000 toneladas de ouro. Para terem uma noção do exigido à Alemanha, todo o ouro alguma vez minado pela raça humana desde o tempo dos primeiros homens até hoje (2012) é algo como 165.000 toneladas. Ou seja, uma dívida simplesmente colossal.
Contra todas as previsões inglesas e francesas, que previam recessão no pós guerra a Alemanha aumentou a produção de madeira, ferro, aço e carvão em 30-40%. Contra também as previsões dos economista da época que declaravam a dívida Alemã como "impagável" a Alemanha gerava mais do que dinheiro suficiente para pagar a dívida.
O problema então? A extorsão. O povo Alemão sentia-se humilhado e espezinhado. Gerava marcos para pagar um dívida que não sentia como sua. Não sentiam a derrota da primeira Guerra Mundial, porque efectivamente o seu exército não tinha sido derrotado, mas sim os políticos. Os termos do acordo de Versalhes não foram discutidos, mas sim impostos.
O resultado foi primeiro ligeiros atrasos no pagamento, e depois suspensões completas de pagamentos por parte da Alemanha. A França reage, e em 1923 ocupa territórios da Alemanha para "incentivar" o pagamento da dívida. Com esta ocupação, e só num ano, a França lucra 900 milhões de marcos. Isto gera uma reacção em cadeia. Ao ver-se privada de uma das suas regiões mais ricas (e motor da sua produção de madeira) a Alemanha entra em hiper-inflação para tentar pagar aos Franceses (o marco que em 1918 valia 5 dólares, passou em Janeiro de 1923 a valer 27,000 dólares, e em Dezembro do mesmo ano 4,200,000,000,000 dólares). Relembro que a ocupação de território Alemão foi contra o tratado de Versalhes, tratado esse que a Alemanha tinha de cumprir (ou seja, paga a dívida pelo tratado, mas não pode exigir a devolução de territórios anexados à revelia do mesmo).
Claro, o crash de 1929 e a grande depressão não ajudam, mas a verdade é que depois do partido Nazi chegar ao poder, a despesa militar era 7 vezes superior ao que a Alemanha teria de gastar se estivesse a pagar a dívida de 1918. Daqui para a frente sabemos o que acontece.
Essa "nuvem" difusa, com o nome de "vontade do povo", usada por partidos de ideologias extremistas para assaltar o poder paira novamente sobre a Europa. Não se trata realmente de dívidas, ou memorandos da Troika, trata-se de famílias sem dinheiro para comer, taxas de desemprego e repressão na forma de impostos e penhoras. O que acontece daqui para a frente, não faço ideia, sei sim aquilo que a nossa Europa é (infelizmente) boa a fazer: Guerra.
4 comments:
Espera lá...
"(...) tratado de Versalhes que exigia o pagamento de 269 mil milhões de marcos (...)"
Mas,
"(...) só num ano, a França lucra 900.000 milhões de marcos."
Não quererá rever os números, General?
Não são 900.000 milhões, mas sim 900 milhões, correctíssimo.
Achas que vem ai mais do mesmo? Desta vez a Alemanha esta novamente descontente, mas nao esta numa posicao muito ma.
Não está em muito má posição, mas consigo ver a posição da Alemanha a enfraquecer rapidamente.
Considera que a Alemanha é, ao fim e ao cabo, uma economia relativamente forte, no panorama actual da Europa. Geralmente, a moeda de uma economia forte valoriza, mas, como a moeda da Alemanha é comum a uma data de economias fracas -- Portugal, Espanha, Grécia... -- a moeda alemã não pode valorizar. Pior: os bens de consumo de luxo, que a Alemanha tanto gosta de exportar -- Audis, BMWs, "Mercedeses", Porsches e, tecnicamente, Lamborghinis -- tornam-se estupidamente caros, porque são preçados numa moeda fraca, ou, pelo menos, não tão forte como seria de esperar face à economia alemã, o que faz com que as vendas fora da Alemanha baixem, porque menos gente tem dinheiro para os comprar. Rapidamente, a posição da própria Alemanha se deteriora...
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