2015-12-24

Star Wars - Episode VII: The Force Awakens (uma crítica)

Deixem-me começar por vos garantir que esta crítica é 100% isenta de spoilers, açúcares refinados, ácidos gordos saturados, sódio, glúten, lactose, glutamato monosódico, alergénios ou produtos de origem animal e, portanto, é adequada a toda a gente.

Portanto fui ontem, já com algum "atraso", ver o novo Star Wars (não estive para me debater com o prospecto de me contentar com um lugar menos bom, numa sala apinhada de fanáticos e preferi deixar passar o fim-de-semana de estreia). Caso ainda não o tenham visto, fica aqui a minha apreciação.

Antes de mais, direi que, visual e estéticamente, o filme está impecável, inspirando-se fortemente na triologia "clássica" (os chamados "Episódios IV, V e VI"), mas com tecnologia gráfica dos dias de hoje, sem cair, contudo, no erro da triologia "prequela" (os "Episódios I, II e III") de abusar do CGI, optando antes por mais efeitos práticos, que produzem uma imagem mais realista e, no fundo, mais "impressionante" (portanto, uma boa escolha).

A história segue os eventos estabelecidos nos seis filmes anteriores. Não é uma continuação directa do Episódio VI na medida em que este é uma continuação directa do Episódio V, implicando antes um intervalo de tempo alargado entre os dois filmes. O argumento deste filme está perfeitamente ao nível dos primeiros, prestando, em muitos momentos, homenagem ou referência ao primeiro filme (ou talvez a semelhança se deva ao facto de ambos seguirem, de forma mais ou menos rígida, a estrutura do monomito). Considerai, no entanto, o seguinte:

O primeiro filme foi feito de forma algo experimental, cruzando a ópera espacial com os filmes acerca da segunda Guerra Mundial das décadas anteriores, a ficção científica com a fantasia, e temperando-as bem com a inexperiência do seu criador, sem qualquer tipo de segurança de que quaisquer elementos da história que ficassem por contar poderiam ser devidamente abordados noutra altura, e, portanto, apesar de, no mythos da saga da Guerra das Estrelas, o filme não ser estanque, a (comparativamente curta) história de como o Luke abandona a quinta de humidade em Tatooine e destrói a Estrela da Morte fica inteiramente contada. Por outro lado, o filme seguinte, "O Império Contra-Ataca", foi feito com o embalo da cresecnte popularidade da marca e com a certeza de que havia de haver pelo menos mais um filme, pelo que o final se permite deixar muitas "pontas soltas" que só seriam resolvidas no filme seguinte. Semelhantemente, este filme foi escrito sob a premissa de que mais virão, pelo que o seu argumento não deve ser julgado como uma história inteira. Peço-vos mantenhais esse pensamento presente, porque virá à baila mais vezes ao longo desta crítica.

O realizador J. J. Abrams, que não é nenhum parvo, claramente se apercebeu de que os "velhos" filmes foram recebidos e são lembrados de forma muito mais favorável que os novos, e certamente quis isolar o que os distingue. Desta forma, não só se inspirou fortemente na primeira triologia como também quis incorporar, neste novo filme, elementos dos antigos. Assim sendo, conforme anunciado nos cartazes publicitários, este filme conta com as participações de Harrison Ford (Han Solo), Carrie Fisher (Leia Organa), Mark Hamil (Luke Skywalker, e em melhor forma que alguma vez nos últimos anos), Peter Mayhew (Chewbacca) e Anthony Daniels (C-3PO). Estes actrores veteranos não só evocam as nossas ternas memórias dos primeiros contactos com este fascinante universo de fantasia como também ajudam a passar o testemunho à nova geração de protagonistas, nos quais é, de resto, colocado o ênfase do filme. Este novo grupo de personagens não se limita a ser uma colecção de equivalentes directos dos protagonistas dos primeiros filmes, mas antes apresenta-nos uma maneira alternativa de desempenhar os mesmos papéis - em suma, uma forma diferente de fazer o mesmo; suficientemente diferente para parecer original, suficientemente semelhante para ser igualmente bom.

Espaço agora ao vilão: Em minha opinião pessoal, o vilão é a personagem mais interessante, senão a mais importante de qualquer história, e sendo tanto a marca como o mythos da Guerra das Estrelas indissociável da figura do Darth Vader, este novo vilão tem a tarefa ingrata de se fazer comparar com um dos maus da fita mais icónicos da história do cinema. Não escamoteando a comparação, este antagonista inspira-se fortemente no seu antecessor, e presta-lhe homenagem, mas não tenta, ainda, substituí-lo. Mantendo em mente o espírito de trabalho em curso, é uma personagem ainda com muito espaço não só para se tornar mais bem definida mas também para crescer, pelo que a comparação com o Darth Vader da triologia clássica se assemelha injusta; uma comparação melhor seria com o Darth Vader do Episódio III - um vilão inexperiente, mas com o potencial de se tornar uma lenda - uma característica, de resto, partilhada pelos novos membros do panteão desta saga.

Finalmente, e porque não se pode fazer um filme da Guerra das Estrelas sem um duelo de sabres de luz, direi, acerca deste, que não me satisfez como me satisfizeram os do Episódio II. Ainda que se note claramente a "semelhança familiar" com o que tinha ficado estabelecido de filmes anteriores, a ausência do trabalho de Nick Gillard, que tinha coreografado e encenado os duelos dos três filmes anteriores, é evidente, mas estou disposto a atribuir a culpa da "timidez" deste último duelo ao carácter maturescente dos demais elementos do filme, esperando que venha a crescer e a tornar-se tão impressionante como os melhores que já vimos nesta saga.

Resumidamente, direi deste filme que, se estiverdes na disposição de o apreciar no contexto a que pertence, ao invés de como uma obra estanque, recomendo vivamente que o vejais (a não ser que não gosteis de Star Wars).

Noutra nota, como não podia deixar de ser nesta data...

DJIMGOLBELS, CRL, DJIMGOLBELS!!!

Um Feliz Natal a todos os meus estimados colegas e amigos da Corporação Disco-Bar.

Pax vobiscum atque vale.

2015-12-09

Vinte e cinco porcento

(Eu queria ter feito uma piadola com o título, tipo "we are the 25%", mas não me ocorreu mais nada sequer menos mau, por isso, vai mesmo assim...)

Às tantas, o melhor é começar por recordar os meus estimados colegas e amigos que conheci a maior parte de vós num ou noutro curso de engenharia, o que nos imbuíu com habilidades matemáticas um ou dois furos acima dos comuns mortais.

Então hoje, ia eu às compras, quando fui abordado por uma menina (ou talvez uma jovem senhora). Invariavelmente, não foi o meu charme nem a minha queixada hirsuta que a atraíram, mas antes a vontade dela de me vender um cartão de crédito. Vulgar. Banal.

Como é hábito dos vendedores, ela quis exultar as virtudes do produto, entre as quais, que, em certas marcas, o cartão oferecia um desconto até 25%. (Antes de mais nada, deixem-me salientar que, com esta história do até se ludibria muita gente. Eu conheço, pessoalmente, clientes da MEO que estão a pagar um balúrdio por "até 50 Mbps de Internet", de onde tiram, num dia bom, 7 Mbps, mas não podem sequer denunciar o contrato por incumprimento da outra parte porque 7 é menos que 50*). E, para reforçar a pujança deste argumento, deu-me um exemplo prático:

"Se comprar um frigorífico da Samsung, que é coisa para custar uns 450 Euros, tem logo um desconto de, para aí, 90 Euros."

Eu confesso que, até aqui, não estava a prestar grande atenção (é que eu já tenho mais um cartão de crédito que os que uso, e outro só vem estorvar), mas esta calinada acordou-me. Desculpei-me e pedi-lhe que se repetisse, e ela gaguejou por uns momentos enquanto tentava calcular 25% de 450 de cabeça até que voltou a cair na casa dos 90. Salientei que 25% de 450 são 112.5, ao que ela me respondeu que não era de matemática nem de ciências, mas antes de Direito.

(A propósito, as engenharias contam como ciências? Eu fico tentado a dizer que sim, que é preciso enveredar pelas ciências logo no 10º ano para se chegar a engenheiro, mas, com o barulho que a malta de Física, indubitavelmente uma ciência, fazia quando os confundiam com a malta de Engenharia Física, fico sem saber ao certo...)

Mas, profissões aparte, será pedir muito que toda a gente saiba de caras que 25% de "quatrocentos e tal" não pode nunca ser menos de 100? Ainda mais, quando se está a querer vender um produto, julgo eu, deve-se pensar bem no que se vai dizer antes de abrir a boca (claro que eu sou supeito de falar, já que, quando era delegado comercial, pensava sempre muito bem nas contas antes de falar de números, mas nunca vendi nada). Está bem que eu tenho tendência a julgar toda a gente pelos mesmos padrões por que me julgo a mim e aos meus pares (vós), mas, mesmo assim, isto é o tipo de asneira que, se eu a tivesse feito na 4ª classe, me teria auferido uma valente reguada em plena palma direita.

Se calhar sou eu que estou errado, e fazer contas de cabeça é domínio exclusivo de marrões e totós, nunca de quem vende cartões de crédito vestindo um casaco de 300 Euros (que, não tive coragem de lhe dizer, nem que o Armagedão destruísse todos os outros casacos que existem valeria tal montante)...

Enfim...

Pax vobiscum atque vale.

* OK, se calhar fiz esta conta demasiado depressa. Se há algum advogado a ler isto, lembre-se que, quando se conta até 50, primeiro conta-se até 7 e depois continua-se. Se me quiser processar por difamação contra a sua profissão, eu moro no nº 7 da minha rua; depois de passar o nº 50, é uma mão cheia de portas à frente.